TN Petróleo – Petróleo e gás – a desmonopolização do mercado, por Antônio Luis de Miranda Ferreira

31/07/2018 | 18h01

Petróleo e gás - a desmonopolização do mercado, por Antônio Luis de Miranda Ferreira

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A greve dos caminhoneiros despertou o país do sonho do combustível farto e barato como motor da economia nacional. Com a realidade se impondo como pesadelo, as posições se radicalizaram, uns defendendo a política de preços livres da Petrobras e outros a volta da intervenção governamental na sua fixação, sobretudo no diesel.

Erros foram apontados, inclusive a opção, por governos passados, pelo modal rodoviário para o transporte da carga nacional, em detrimento das ferrovias e hidrovias até a diminuição dos valores relativos do frete em face do aumento desmesurado da frota de caminhões, fruto de financiamento público a taxas subsidiadas.

Sem dúvida, podem ter sido erros, mas não os únicos, talvez nem os principais. A história da nossa indústria de petróleo e gás aponta para outros equívocos cometidos, cujos impactos estamos sentindo hoje.

Começando pela chamada flexibilização do monopólio estatal do petróleo, trazida pela Emenda Constitucional nº 9, de 1995 e pela Lei do Petróleo, de 1997, que adotou o modelo de “desmonopolização para frente”, com a preservação dos ativos e interesses da Petrobras, assumindo-se que a competição no mercado viria a ocorrer com a entrada de novos agentes, já que o modelo previa a possibilidade de a União Federal contratar as atividades sujeitas ao monopólio estatal com empresas estatais e privadas.

O modelo funcionou para algumas atividades, como a de exploração e produção, que foram submetidas a um regime competitivo de concessão, com a realização de licitações públicas, ao qual a Petrobras também estaria sujeita.

O sucesso de tal modelo pode ser atestado pelos resultados das diversas rodadas de licitação promovidas pela ANP ao longo do tempo, que permitiram o ingresso de empresas privadas na atividade, o aumento da produção e o engrandecimento da própria Petrobras, que viveu uma época de intensa produtividade e lucratividade, inclusive com a descoberta das reservas do pré-sal.

Nas demais atividades, onde os interesses e ativos da Petrobras foram preservados, a “desmonopolização para frente” não surtiu os efeitos esperados. A Petrobras continuou dominante no mercado e controlando a infraestrutura essencial, dificultando o acesso de terceiros interessados a terminais e dutos, inibindo importações e afastando investimentos em refino. Ou seja, o monopólio legal foi transformado em monopólio de fato. Sem contar, é claro, com a sempre presente ameaça intervencionista do governo no que diz respeito ao controle político dos preços dos combustíveis.

Na área do gás natural, as dificuldades são ainda maiores, pois, sendo uma indústria de rede, o fato de os ativos relevantes permanecerem sob o controle da Petrobras distorce o mercado. Pela Lei do Gás, a empresa não é obrigada a permitir o acesso de terceiros aos seus dutos de escoamento, unidades de processamento e terminais. Pode negociá-lo, mas as negociações nunca prosperam tendo em vista os seus próprios interesses. Isso precisa ser urgentemente atacado, modificando-se pontualmente a lei.

O programa de desinvestimento que vem sendo tocado pela estatal dá alguma esperança ao mercado. Ativos relevantes foram ou estão em processo de ser vendidos, como recomendavam alguns dos modelos de desmonopolização discutidos nos idos de 1995.

No entanto, mesmo que tais ativos venham a ser transferidos a outros investidores, precisam eles se tornar acessíveis aos agentes da indústria. Não basta vender, é preciso promover a sua plena utilização através de regulação adequada, liberando capacidades ao mercado. Os direitos contratuais de uso dos antigos proprietários devem ser respeitados, mas posições dominantes e anticompetitivas devem ser desconstituídas. O chamado “gas release” foi implementado com sucesso em outros países, abrindo os seus mercados.

O programa de desinvestimento que vem sendo conduzido pela Petrobras, tanto na área de petróleo, quanto na de gás natural, com a venda de dutos, terminais e refinarias, pode trazer benefícios à indústria, retirando da estatal o protagonismo que já lhe vem causando mais problemas do que vantagens. Apesar das recentes decisões do Supremo Tribunal Federal quanto ao prosseguimento do programa, o mercado espera que as objeções sejam logo superadas, retomando-se as negociações com os potenciais investidores.

Mas o programa somente será benéfico ao mercado se acompanhado de medidas que assegurem a utilização plena dos ativos envolvidos, seja pela garantia de acesso a terceiros interessados, seja pela concepção de modelos de alienação que garantam a integração inteligente e estrutural dos elos da cadeia. Ativos que se isolam ou podem ser isolados não atraem investidores. Tudo isso, evidentemente, com a garantia do governo de não intervir nos preços dos derivados e do gás natural, dando segurança jurídica e política aos investidores.

Sobre o autor: Antônio Luis de Miranda Ferreira é advogado e sócio do escritório Schmidt, Valois, Miranda, Ferreira & Agel Advogados

Fonte: Antônio Luis de Miranda Ferreira

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